Dr. Othoniel Furtado Gueiros |
Por
ocasião do centenário de nascimento do grande medico e amigo Othoniel Gueiros,
sua família resolveu homenageá-lo com a edição de um livro que tomou o título
de “OTHONIEL GUEIROS – O LEÃO DO
SENHOR”. Para tanto, solicitou colaboração de varias pessoas, entre as
quais, fui incluído no convite e o texto que enviei a Everardo, sem que me
avisassem, foi colocado como “Apresentação” do livro, o que muito me honrou e
envaideceu. Essa “Apresentação” é exatamente o texto que transcrevo abaixo, que
merece divulgação, não por sua singeleza, mas pela grandeza do homenageado:
A marca era inconfundível. As mãos esfregando
freneticamente, uma na outra, derrubando uma mecha de cabelo prateado sobre a
testa. Sua efusão era motivada, sempre, por uma notícia alvissareira ou uma
informação desagradável – tanto fazia – a reação era a mesma. Uma vitória ou
uma derrota de sua UDN; o sucesso ou o fracasso de suas investidas eleitorais;
o resultado dos embates na Câmara de Vereadores; a recuperação ou o desenlace
de um paciente; o sucesso ou a frustação de um amigo provocavam a sua notória e
sempre esperada manifestação gestual.
No exercício da profissão, fazendo os
partos nas residências das gestantes em precárias condições, ao considerar que
ainda não era hora de consumar a délivrance,
impressionava pela sua paciência em aguardar o momento certo que poderia varar
a noite, enquanto se acomodava numa poltrona qualquer para tirar um cochilo.
A sua extrema dedicação, que poderia
resultar, numa noite, em fuga desabalada pelo tabuleiro, receoso do marido
desesperado que perdera a esposa em parto laborioso no próprio sítio, ou
receber o elogio de um marido agradecido pelo cura de sua esposa, nos seguintes
termos: “Dotô, desses dotôzinho rabo de
cabra que tem nessa terra, o sinhô é o melhorzinho deles!”
O
seu verdadeiro sacerdócio no exercício da medicina, desprendido e generoso, fez
dele um homem sem riquezas materiais e assim morreu. Mas deixou um legado acima
de dimensões concretas, como esposo e companheiro, como pai carinhoso, como
amigo fiel e pelo comprovado amor aos seus semelhantes, tantas vezes
demonstrado.
A sua fidelidade aos princípios que
defendia, de qualquer natureza, sejam políticos, profissionais ou religiosos.
Nunca receava emitir opiniões, pois era extremado em sua defesa e nem delas
fazia segredo, já que sua incontida franqueza não o permitia.
Ah! Othoniel, ainda que pareça
impossível, você conseguiu extrapolar todas essas qualidades com uma razão que
foi toda a sua vida. Uma extraordinária capacidade de indignar-se, nunca
observada nos homens comuns e somente comparável ao herói de Cervantes, para o
que não lhe faltava, sequer, o fiel escudeiro, não rotundo como Sancho, na
figura esquálida de Aristino.
Sempre pronto para verberar as
injustiças, sem medir conveniências e sem receio de represálias. Arrostando os
moinhos de vento da iniquidade, sem esperar recompensas que não a satisfação
dos seus singulares protestos.
Como isso nos faz falta nos dias de
hoje, quando a leniência e a tolerância dos nossos homens públicos minimizam as
ilicitudes e banalizam as maldades.
A prática consentida dos pequenos
ilícitos subverte os valores seculares e instiga o cidadão comum à sua
reiteração, Afinal, em nosso pobre e vilipendiado país prende-se, sem
contemplação, por mais de cem dias, uma pobre mulher pelo roubo de um pote de
manteiga e permite-se a impunidade dos que assaltam os cofres públicos e deles
desfrutam em gordas contas no exterior.
Esteja onde estiver, na bem
aventurança de sua paz interior ou na satisfação do bem que distribuiu em vida,
deve estar esfregando as mãos com mais vigor ainda, cabelos na testa e voz
rouca, recriminando as injustiças, condenando o despudor e verberando a
desonestidade.
Que os seus amigos mantenham viva a
sua incontida indignação é a maior homenagem que lhe pode ser prestada, meu
sempre querido Othoniel.
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