sábado, 31 de outubro de 2015

CONVERSA DE BARBEARIA

Já pensaram na permanência teimosa da designação de “barbearia” quando na verdade destina-se mais ao corte de cabelos e às maravilhosos prosas entretidas pela freguesia e sempre provocadas pelo “barbeiro”?

Mantenho a tradição e durante muitos anos persisto em cortar o restinho de minha outrora cabeleira com o velho amigo Isaque, no seu box da Colunata em plena avenida Santo Antônio em Garanhuns . Lá a conversa corre solta e os mais variados assuntos são levantados. Claro que alguns deles são recorrentes, como a crise nacional, a demência ética e moral do país, a saúde, a educação e, para não fugir a regra: a insegurança. Esta semana estive lá e a propósito da violência que se irradia como uma praga no mundo inteiro, tivemos ocasião de referir os conflitos que dominam os noticiários.

Chacinas e mortandades em números assustadores, e o que é mais grave, em nome DA FÉ; no futebol – paixão nacional – as torcidas não mais assistem os jogos e sim duelam agressivamente em confrontos até mortais, em que surgiu uma nova arma: as bacias sanitárias; o sistema de saúde está sendo destruído, conforme denúncias públicas, pelo uso temerário e imprudente do uso de motocicletas que estão destruindo praticamente toda a disponibilidade dos serviços de emergência médica do país; as discriminações de toda a espécie que terminam desaguando em acessos articulados de raivas e odiosidades; a elevada incidência dos chamados crimes de proximidade (40%) em relação aos crimes de morte que alcançam até as relações de vizinhança; a degradação das instituições familiares que, em nome da segurança econômica, só permite a reunião e o encontro dos seus membros quando muito em esporádicos fins de semana. O linguajar chulo, desabrido e pornográfico que está tomando conta das redes sociais, em que ninguém se respeita e qualquer dia desses dias vai obrigar a retirar as crianças da sala para permitir o seu acesso.

Tenho reclamado muito e escrito bastante que, no fundo,  a origem está no corpo social doente e violento e a insegurança que observamos é em grande parte decorrente da grosseria que domina toda a sociedade. Façamos uma auto-crítica e reconheçamos que temos uma sociedade grosseira e mal educada.

As pessoas já não se cumprimentam. Nas cidades grandes, até nos prédios de apartamentos não se sabe sequer o nome dos seus vizinhos de porta. Caíram em desuso as expressões: bom dia, muito obrigado, boa noite, por favor, dá licença, desculpem, e qualquer acidente bobo no trânsito provocam reações absurdas de agressividade. Furam qualquer fila com o maior descaramento e reagem com fúria, à qualquer reclamação (eu mesmo, numa fila de idosos, fui chamado de grosseiro e mal-educado por ter reclamado de uma madame posuda, furando a fila e sem ter nada de idosa). Reclamam da limpeza da ruas, ao tempo em que conduzem os seus mimosos cachorrinhos para cagar nas ruas. Reclamam por ciclovias para proteção dos ciclistas, mas (mesmo onde existem ciclovias como na Avenida Boa Viagem) desfilam despudoradamente nos calçadões dos pedestres e ai de quem protestar. Para não parecer implicância (pasmem!) já asssisti pedestres fazendo cooper nas ciclovias, atropelando as bicicletas.

Procuro reagir à minha maneira e, sempre de forma educada e bem humorada, insisto em demonstrar, de forma respeitosa, uma solitária e talvez infrutífera reação à essa postura de indiferença das pessoas quanto ao bem estar que as relações humanas podem causar. No caso da madame, contado acima, consegui a manifesta solidariedade e o aplauso do restante da fila quando ao ser chamado de mal educado, respondi-lhe sem levantar a voz:

“Minha senhora, eu tenho certeza de que não sou um mal educado, mas tenho pena dos seus filhos que devem  estar recebendo uma péssima educação doméstica”.

A madame saiu furiosa e foi procurar uma outra fila do super-mercado
Adoto o sistema e o aplico com regularidade. Ao chegar em qualquer ambiente, de salas de espera de qualquer tipo, lojas e a elevadores, cumprimento efusivamente com um esplendoroso bom dia os circunstantes sisudos e ressabiados à qualquer proximidade dos seres humanos. Quase sempre são surpreendidos pela minha manifestação e, mesmo surpresos, atarantados respondem ao cumprimento e percebo que ficam satisfeitos.

Estou chegando à conclusão que preciso ser um “Seu Lunga” bem humorado para não ser considerado um velho abusado e de mal com a vida. Não quero ser recebido como um importuno e trapalhão. Devo manter os meus princípios e meus valores sem pretender impô-los, pois não sou dono da verdade, e respeitar o pensar alheio. Estou satisfeito com essa minha postura e, vez em quando, sou recompensado e alegro-me com a convicção de que não estou errado. Diverti-me muito a uns dias atrás e vou contar:

Precisei ir a um escritório localizado na Torre “A” do Empresarial Rio Mar. Deparo-me com um vestíbulo enorme, comum às três torres, em que caberia com folga uma quadra coberta de basquete. Sem qualquer indicação visual, dirigi-me a um cidadão, entre outros, postados naquele espaço vazio e vestidos impecavelmente, como em nível de segurança presidencial. Interpelei-o sobre a Torre “A” e atenciosamente fui encaminhado a um balcão de recepção exclusivo onde deveria ser cadastrado e munido de um cartão magnético que permitiria o acesso aos elevadores da Torre “A”.

Como de costume, uma fila formada para se cadastrar composta de pessoas sisudas e ressabiadas cumprindo aquelas obrigações impostas pelo cotidiano. Esperei pacientemente até chegar minha vez e uma gentil recepcionista me atende e solicita minha carteira de identidade. De posse de minha carteira, começa a digitar no computador todos os dados requeridos para o cadastro até que me devolve a identidade e antes de me entregar o cartão magnético que me permitiria ir ao destino requerido, solicita-me:

“O senhor me permite que tire uma foto sua ?”

Respondi-lhe na hora:

“Permito, senhorita. Mas só queria entender o que diabo uma mocinha nova e engraçadinha como você pode querer com a foto de um velho caindo aos pedaços e que não serve mais pra nada ?”

Não deu outra! A descontração foi total, caiu todo mundo na risada, inclusive a tolerante recepcionista e instalou-se o bom humor e a cordialidade naquele ambiente frio e impessoal.


Para coroar o dia benfazejo, no mesmo local e na mesma hora reencontrei um querido amigo e sua família que a mais de vinte anos não via: O médico e cidadão - dos bons -  Dr. Marconi Dantas que trabalhou comigo na Cosinor. Aleluia...    

domingo, 2 de agosto de 2015

É MUITA COISA SEM JUÍZO - A Inversão do Crime

A Nação enlouqueceu de vez. A demência ética e moral tomou conta do coração e das mentes das pessoas ditas responsáveis – autoridades institucionais do país – e hajam heresias, maluquices (será?), inversão de valores e princípios, declarações estapafúrdias e escamoteações de toda ordem para esconder os crimes praticados sem cerimônia, em todas as esferas do poder e da sociedade. Senão vejamos:

1.      O Sr. Wadih Damous, na qualidade de ex-Presidente Nacional da OAB e Deputado Federal do PT de São Paulo, em exercício como Suplente convocado, afirma em entrevista, despudoradamente, que: “

“Ao ser questionado se, na opinião dele, o esquema de corrupção em torno da Petrobras ainda não estaria comprovado, responde que não sei o que é fato ou não. Não sei, porque uma atitude arbitrária, como a que caracteriza a conduta dos juízes e procuradores, cria confusão até para quem é do mundo jurídico sobre o que é fato e o que não é.”

O que é que é isso ? Um Deputado Federal com a origem profissional que possui, não lê jornais ? Vive em outra galáxia ? Não tomou conhecimento da deliberação da Petrobrás reconhecendo e reajustando sua contabilidade para conformá-la ao prejuízo sofrido através da corrupção e reconhecido por Deliberação de seu Conselho de Administração, baseado em pareceres de Auditoria Independente ? Providência essa exigida das sociedades de capital aberto pelas Bolsas de Valores e órgãos reguladores de investimentos, inclusive nos Estados Unidos? Duvida da sanidade mental dos brasileiros, imaginando-os um aglomerado de imbecis ?

Diante de todas provas e o procedimento da própria Petrobrás reconhecendo a sua existência pela correção procedida em sua contabilidade, é honesto por em dúvida a corrupção reconhecida pela própria Petrobrás? Quer convencer quem ? Os incautos, os idiotas e os simplórios?

Dia 31 de julho de 2015, o próprio site da Petrobrás publica a notícia do ato solene de recebimento em sua sede, dos valores já recuperados pelo Ministério Público Federal, DESVIADOS pelo esquema da gangue denunciada como instalada na empresa:

“Hoje, foram devolvidos R$ 139 milhões, sendo R$ 69 milhões referentes a desvios do ex-empregado Pedro Barusco e R$ 70 milhões desviados pelo ex-diretor Paulo Roberto Costa. Esse foi o segundo montante de valores devolvidos. Em maio, o Ministério Público Federal já havia feito a devolução de R$ 157 milhões repatriados pela Operação Lava Jato.”

Ou seja, A Petrobrás já recebeu de volta, resgatada pela atuação do Ministério Público Federal, a “modesta” importância de R$ 296 milhões de reais ROUBADA da empresa, pela quadrilha organizada e identificada pelo aludido órgão. E aí, Ilustre Causídico Dr Wadih, ex-Presidente Nacional da OAB, como sustentar a sua fingida e hipócrita dúvida quanto à veracidade do ROUBO DA PETROBRÁS, diante da reconhecida recuperação do roubo pela própria direção da Petrobrás ?

O senhor quer enganar a quem ?  O senhor deve ser homem de muitos saberes, de muitos galardões, de muitos títulos e deferências, mas está a serviço do que e de quem?

2.     Em nossa espoliada Nação, sempre se reclamou que “cadeia é só para preto, pobre e prostituta”, mas bastou julgar, condenar e meter na cadeia figuras notáveis da política, do empresariado e da elite nacional para, de imediato, surgirem os falsos defensores da ordem legal e constitucional, acobertados pelos próprios acusados e pelos belos honorários que conseguem receber.

Monta-se uma picaresca ideologização do processo, transfigurando um caso de polícia em debochada questão de direita e esquerda, mesmo que, para isso, seja impreterível a desqualificação das instituições e dos operadores da Justiça. Acusa-se, cinicamente, “uma atitude arbitrária, como a que caracteriza a conduta dos juízes e procuradores”, mas esconde-se a circunstância de que até agora NENHUMA DECISÃO do Juízo de 1ª Instância foi revogada ou modificada pelos Tribunais Superiores. Todos continuam democraticamente presos!.

Acusa-se, de forma ridícula, que a Direita quer destruir a Petrobrás quando, na verdade, o maior estrago causado na maior empresa nacional e orgulho de todos os brasileiros teve origem no aparelhamento político-partidário que transformou o nosso patrimônio em butim dos piratas que a assaltaram.

Sou um velho, testemunha da história brasileira que foi para as ruas defender a criação e implantação da Petrobrás, ombreado com nacionalistas de todos os matizes. A campanha do “PETRÓLEO É NOSSO” não foi privilégio de qualquer partido político e a luta foi dura, pois lutava-se, sim, contra o poderio econômico mundial e apátrida, capitaneado pelas “sete irmãs”.

É o mesmo poder supranacional que visa tão somente o lucro fácil e garantido que, não se interessando pela insignificância do mercado da pequenina Cuba, assume a defesa da “civilização cristã e ocidental (!)” para manter o pequeno país submetido a um impiedoso bloqueio econômico, durante mais de cinquenta anos.

Ao mesmo tempo, esse poder supranacional, seduzido pelo lucro garantido de um mercado interno de um bilhão e meio de consumidores chineses e pela mão de obra barata, desloca para a China a maioria das grandes empresas multi-nacionais sem o menor pudor ideológico, inseridos no regime político dominante na nação asiática. Capitalistamente, pouco lhes importa a bravura da grande marcha de Mao Tse Tung ou o massacre da Praça Vermelha.

Só existe uma forma para salvar a Petrobrás: fortalecê-la com uma administração competente, séria e comprometida com a Nação Brasileira; meter os ladrões que a assaltaram na cadeia, independente de suas colorações partidárias e empresariais; e garantir os instrumentos indispensáveis ao Ministério Público e ao Judiciário (A Nação lhes será grata) no sentido de trazer de volta à empresa os valores que foram roubados.

Estremeço quando ouço falar em venda de ativos, concessão de exploração do pré-sal, antecipação de recursos e coisas tais. É sinal de chumbo grosso pela frente, novas negociatas internacionais, novas fortunas construídas, aumento do consumo de vinho Romannée Conti e champanha Cristal Don Perignon!






 








domingo, 12 de julho de 2015

AH! OS LADRÕES DE GALINHA

Diante desse bombardeio constante de notícias sobre mal feitos, roubos, corrupção, alcançando cifras monumentais e dando a ideia de que isso é prática cotidiana, apertou-me uma saudade danada – até com certa nostalgia – dos LADRÕES DE GALINHA de antanho.

O roubo de galinhas na minha Garanhuns, como de resto em todas cidades de antigamente, era o delito mais ocorrente, dando constante trabalho aos policiais e nada mais degradante que a condução em desfile pelas ruas, custodiado por um soldado, até à Cadeia Pública, dos reles ladrões de galinha. A prática era contumaz por força da proliferação dos galinheiros existentes, praticamente, em todas as casas. Toda casa tinha um quintal e todo quintal tinha um imprescindível galinheiro.
Era a condição para manter-se um bom estoque de alimento sadio (naquele tempo não se falava em proteínas e coisas tais e não existia refrigerador para conservar comida) para o consumo da família e sempre à disposição da dona da casa para acudir a emergência de um convidado imprevisto. “Corre, Vicentina, para matar uma galinha pro almoço de Compadre Tonho que acaba de chegar!
Parece que estou vendo o ritual de todos os dias. Começava com o recolhimento dos ovos diretamente nos “ninhos” das galinhas poedeiras e, logo após, as pessoas encarregadas chamavam todo o galinheiro para receber a ração diária de comida, em forma de milho, xerém, alguns restos de comida, e ainda escuto o canto da chamada para atrair as galinhas, em refrão invariável: “titi,titi, titi....”.

Algumas delas eram postas para chocar e, por consequência, garantirem a renovação do plantel. Estavam sempre lá, impassíveis, sem levantar de seus ninhos para cumprir a tarefa designada e naqueles ovos ninguém tocava.
Galinhas gordas, de carne macia e saborosa, sem aditivos hormonais, asseguravam uma alimentação saudável para todos, sem contar a riqueza do paladar de uma galinha guisada com angú, uma galinha de cabidela usando o sangue fresquinho colhido na hora e batido com vinagre para não estragar, o requinte de um sarapatel de miúdos de galinha e a disputa da família, na mesa, pelas partes preferidas de cada um.

O galo reinando majestoso em seu harém e sempre ativo cumprindo o prazeroso ofício de satisfazer as suas odaliscas, complementado com a tarefa, sem erro, pela marcação das horas como se fora um relógio e invariavelmente cantando o alvorecer. Lembro de uma antiga marchinha de carnaval exaltando a eficiência do galo que dizia assim:
O galo quando canta Maria,
É dia Maria, é dia Maria.
Mas quando canta fora de hora
È moça roubada que vai dando o fora!

Como se vê, os galinheiros eram uma atração sedutora - desde que não tivesse cachorros na casa - dada a sua vulnerável localização sempre nos fundos dos quintais, a quantidade enorme de galinheiros que permitiam, até, uma escolha dos melhores plantéis disponíveis e os acessos mais fáceis, venda segura e, na alternativa, bela refeição para a família do larápio.
Aí começava, também, a parte mais difícil: a espreita até altas horas da madrugada no aguardo do momento em que todos estivessem dormindo, cochilando por vezes, mas atento aos menores sinais de movimento na casa. Chegando a hora favorável, pulava o muro e com a máxima rapidez possível, metia uma meia dúzia de galinhas em um saco.

Quando o dia amanhecia, o ladrão também amanhecia na feira para vender as galinhas por qualquer preço e por atacado, para se livrar depressa do objeto do roubo. Danava-se da vida, algumas vezes, pelo surgimento inesperado de outros concorrentes que, pelo excesso da oferta, fazia rebaixar o preço e sua cotação na feira.
O grande azar do ladrão é que frequentemente os donos das galinhas, ao acordar cedo, dava com o roubo no seu galinheiro e corriam pressurosamente à feira, na tentativa de encontrar  suas estimadas “penosas”. E não dava outra: Bingo! Lá estavam elas e muitas vezes ainda acompanhadas pelo autor do terrível delito. Não havia clemência, porradas no ladrão e convocação de um policial para prender e conduzí-lo até à cadeia para sua apresentação ao Delegado.  

Era terrível a humilhação sofrida pelo insignificante ladrão, ao percorrer a pés o longo trajeto desde a Avenida Santo Antônio (local da feira), Rua 13 de Maio, Praça Dom Moura, Rua Afonso Pena, até à Cadeia, no local que hoje abriga o Colégio Estadual, escoltado por um soldado, com a população à beira das calçadas durante todo percurso vaiando o infortunado meliante. Desconfio que a reprovação era muito mais pela mediocridade do roubo do que pela gravidade da infração!. Ladrãozinho vagabundo...
Com a reiteração das ocorrências e a exposição do seu nefando crime perante à população, claro       que tiveram sua atividade refreada e a possibilidade de sucesso reduzida. A liberdade de movimentos contida pela simples identificação já não permitia a sua continuação. O jeito era mudar de cenário e procurar galinheiros de outras cidades. O êxodo era inevitável mas eram logo substituídos por outros!

Falei, no começo deste texto, que lembro até com certa nostalgia dos ladrões de galinha, oriundos da singeleza dos costumes e da cultura dominante naquele tempo dos loucos maravilhosos como Manoel das Estrelas, dos desordeiros como Turrica, dos bêbados como Bode Cheiroso, dos filósofos como Jeitoso, e insiro aqui os anônimos Ladrões de Galinhas quando comparados com os faraônicos ladrões de hoje, como é o melhor exemplo um simples gerente da Petrobrás – executivo de terceiro escalão – que já devolveu a Nação nada menos que 97 (noventa e sete) milhões de dólares de um modesto (!) depósito na Suiça.
Palmas para os desprezíveis ladrões de galinhas.

sábado, 11 de julho de 2015

É MUITA COISA SEM JUÍZO - DINHEIRO FALSO ?

Esse é o terceiro episódio, em que extravaso a minha inquietação pelo que está ocorrendo em nosso Brasil. Lutei muito durante  longa vida para transmitir aos meus descendentes um país melhorzinho do que recebi e, por vezes, acreditei que conseguiria. Mas de uns tempos para cá, parece que fomos tomados por uma loucura epidêmica, eliminando o bom senso e o respeito, a solidariedade e prevalecendo uma cultura dominada pela grosseria, pela intolerância e pelas agressões gratuitas. As coisas estão acontecendo no Brasil, sem a menor razoabilidade e um mínimo de lógica e, por consequência, impossível de justificar de acordo com as mais elementares regras de decência, honradez e convivência.

Dizia esta semana para um amigo que do jeito que as coisas estão evoluindo, logo estaremos tirando as crianças da sala para poder abrir o Facebook, dada a virulência e o despudor da linguagem adotada pelos participantes. Como se não bastasse o fundamentalismo religioso que está massacrando milhares de “infiéis” em nome da FÉ, está se criando um fundamentalismo político-partidário insuportável e um fundamentalismo esportivo em que se mata gente tendo uma latrina como arma. Fica difícil de suportar. As notícias nos surpreendem à cada hora e eu estou com dificuldade de entender. E tudo passa a ser trivial e admissível.

Parece brincadeira, mas não é. Se não fosse notícia dos jornais do país inteiro, ninguém seria capaz de acreditar. Vejo diante de mim e do computador na minha mesa, a manchete da página 1 do Caderno de Economia do Jornal do Comercio de 27 de junho de 2015.

Leio estarrecido. Respiro fundo. Belisco meu braço para comprovar que não estou dormindo e sonhando. Vou à janela para me convencer que estou na minha residência e não noutro país. Consulto o calendário e a data confere. Fato corriqueiro, deve imaginar o povo brasileiro nesse quadro geral de demência ética e moral que impregnou definitivamente a cultura dominante!. Reproduzo a manchete:

“Banco do Brasil vende dólares falsos. Pai e filha estão retidos nos Estados Unidos após tentarem depositar em agência americana dinheiro comprado no banco”

Como é mesmo ?  O Banco oficial de um país civilizado vendendo dinheiro falso ?  O nosso Banco do Brasil S/A, instituição bancária respeitável e secular, aceitando dinheiro falso e servindo de mula para falsários ? Operação somente desmascarada nos Estados Unidos (que vergonha!) mediante a intervenção do FBI que meteu algemas no infeliz casal portador e apreendeu o dinheiro falso. O vexame exigiu a intervenção diplomática da Embaixada Brasileira Será que não existe mais nada sério neste pobre e espoliado país ? Em quem se confiar ? Será, pelo que se observa, que o mal tomou conta do coração e das mentes de todos que só pensam em se aproveitar de tudo e de todos ?

Algumas perguntas são inevitáveis para os leigos como nós, sobretudo diante do silêncio ensurdecedor e sepulcral que cerca o episódio. Parece que instalou-se uma conspiração de omertá uma vez que as autoridades responsáveis não se manifestam e o assunto é conduzido sem nenhuma transparência. Pesquisei a matéria a partir da data da primeira ocorrência e a constatação foi mais triste ainda. A despeito da imperativa intervenção do serviço diplomático em país estrangeiro, o Governo Federal não deu a menor satisfação ao povo brasileiro. O Banco emite apenas, através de uma Superintendência Regional, uma nota anódina e inconvincente sem explicar nada. Todos fazem cara de paisagem como se tudo fosse natural e não estivesse acontecendo nada. Há 15 dias retiraram de pauta e não se fala mais nisso em nosso país !

Sabido que o Banco do Central do Brasil é o órgão de regulação e controle do sistema financeiro nacional que envolve o controle e fiscalização do sistema bancário, não teria a obrigação indeclinável de dar uma satisfação à Nação explicando o ocorrido e justificando, se fosse capaz ?

Dias depois, com a divulgação da existência de 6 (seis) casos já constatados na agência central do Banco do Brasil em Recife de dólares falsos recebidos e passados adiante (?) é que, após ser autuado pelo PROCON-Pernambuco de acordo com a legislação de Defesa do Consumidor, surgiu uma nota da agência do Recife, suspendendo as operações de câmbio com a moeda norte-americana por 30 dias, que se revela um primor de desavisada ingenuidade e um desvio ostensivo do verdadeiro foco da questão.

Essa nota é tão surrealista quanto à circulação de dólares falsos em suas agências e sua autenticidade concorre com a qualidade do dinheiro circulado em seus caixas. Comecemos pela origem da nota que, em se tratando de questão grave e de repercussão internacional, deveria ser iniciativa da Direção Geral do BB e não de uma simples Superintendência Regional. E quem garante que em outras agências pelo país afora não estejam ocorrendo ilícitos iguais que exigiriam idênticas medidas às adotadas em Pernambuco?

Confessa, ainda, que tomou a providência de “suspender o serviço de câmbio em todas as agências do Estado por 30 dias” o que quer dizer: a providência não foi iniciativa própria e somente foi tomada atendendo à autuação do Procon-Pernambuco que tem jurisdição e competência restrita apenas a este Estado. Vamos pelo menos falar com um mínimo de sinceridade. Não fosse a atuação vigilante das autoridade estaduais, através da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos, seguramente continuaria a enxurrada de moeda falsa circulando em seus escaninhos, sem qualquer providência.

E aí vem o mais grave da nota. Ao invés de lamentar a ocorrência de tão grave fato e, se possível, justifica-lo prefere explicitar um tendencioso desvio do verdadeiro foco da questão para “lamentar a notificação recebida, sem qualquer pedido de esclarecimento”. Essa atitude corresponde, com todo o respeito, à reação do marido ultrajado vendendo o sofá para que sua mulher não mais prevaricasse nele. Maldito vezo brasileiro de não preocupar-se com o cerne das questões e identificar as cáusas que as estão provocando. Considera-se mais o acessório que o principal. Mais as formalidades que o essencial. O correto não seria apurar o afrouxamento de regras que permitiram tal calamidade ?

É inevitável que se coloquem algumas perguntas ingênuas, à moda de Garrincha na véspera do jogo com os russos na Copa do Mundo, e perdoem minha ignorância. Não existem recursos técnicos e tecnológicos para contagem e aferição da autenticidade de papel moeda ?  O Banco do Brasil já tomou conhecimento da existência de tais equipamentos, se for o caso ? Caso positivo, o Banco do Brasil já equipou suas agências com eles ? Caso positivo, eles são obrigatoriamente utilizados no recebimento do papel moeda ? Caso positivo, como admitir-se a entrada e a saída de dinheiro falso, em qualquer quantidade e em qualquer agência do Banco, depois de aferidos por esses equipamentos ? Confia-se, apenas, na habilidade digital dos caixas ?

É muita irresponsabilidade na prática e na solução das barbaridades, muita indiferença, muita leniência e, sobretudo, MUITA COISA SEM JUÍZO!

 
 

 

domingo, 5 de julho de 2015

É MUITA COISA SEM JUÍZO - Episódio 2


        Em minhas inquietações sobre as esquisitices que estão acontecendo em todas as   atividades     do  país, configurando uma inusitada epidemia de loucura, começo a me deparar com o início       de uma orquestrada movimentação com a finalidade de desqualificar a ordem legal e judiciária    da nação brasileira, a exemplo do que ocorreu na  tramitação do chamado “mensalão”.

No chamado “Petrolão” começam a surgir os jurisconsultos de plantão; os bem-aventurados advogados mais caros do Brasil justificando os honorários da sua atividade profissional (mercado em alta); ilustres professores deitando cátedra e verbalizando as mais fantásticas elocubrações jurídicas; jornalistas reproduzindo contorsivas fundamentações em torno de uma chamada DELAÇÃO PREMIADA, instituto jurídico-processual consagrada no mundo inteiro e que permitiu, como se sabe, que o Magistrado italiano Giovanni Falcone, através de sua aplicação,  conseguisse arrebentar a “Cosa Nostra”, a “Máfia Italiana”, até então a maior estrutura do crime organizado no mundo.

Comecei a pensar: porque no Brasil é moda ou cultura avacalhar tudo que é sério ou que incomode o poder dominante, sobretudo o econômico? Sempre para permitir a manutenção das patifarias? Todo o mundo reclama que cadeia no Brasil é só para preto, pobre e prostituta mas quando acontece como agora meter-se na cadeia, com todas as formalidades legais, os maiores empreiteiros do serviço público e titulares das maiores fortunas, surgem logo os  pressurosos Zorros de plantão , defensores dos oprimidos, pobres vítimas (?) de uma ordem legal absurda.  

Compara-se os comprometidos no regime processual com Joaquim Silvério dos Reis, os torturadores dos Doi-Codis e só faltou incluir Judas Iscariotes na lista. A Presidenta que, em sua posse, jurou a defesa das instituições e da ordem legal, falando no exterior, critica a norma que ela própria sancionou, ofendendo ao juramento de posse como Presidente do Brasil!

A extravagância dessa sórdida posição levou-me a curiosidade de pesquisar a aplicação da norma jurídico-processual que, a despeito de haver sido saudada como grande instrumento de combate à corrupção, como menos de dois anos de vigência, é acusada como inconstitucional, anti-democrática, cerceadora do direito de defesa e favorecedora da iniquidade da delação!

Percorri toda a legislação vigente no Brasil e no exterior. Verifiquei que não é tão nova assim entre nós, porque desde 1990 começou a surgir legislação esparsa prevendo sua aplicação em crimes hediondos e crimes contra a ordem econômica, coroando com a Lei nº 12.850/2013, votada pelo Congresso e sancionada pela Presidência da República que regulamenta de forma definitiva o instituto jurídico-processual (e aí vem a primeira surpresa!) da COLABORAÇÃO (!) PREMIADA. Fiquei espantado com a descoberta e pasmem todos com a constatação!:

NÃO EXISTE NA NORMA LEGAL BRASILEIRA ESSA FIGURA DA DELAÇÃO PREMIADA !

Nenhuma dessas leis fala em DELAÇÃO e, essa última, em seus 27 (vinte e sete) artigos, tem 5 (cinco) referências à palavra  COLABORAÇÃO PREMIADA”; 8 (oito) à palavra “COLABORAÇÃO” e 14 (quatorze) à palavra “COLABORADOR”. Não existe – e desafio quem mostre - qualquer referência às denominações “Delação Premiada”, “Delação” e “Delator”.

Pesquisei no Direito Comparado e verifiquei que, lá como cá, não se consigna essa denominação ultrajante na codificação legal estrangeira. É invenção brasileira, não da lei, mas das artificiosas invenções do mal que tomaram conta desta depredada Nação.!

Na legislação italiana o instituto processual é chamado de “Colaboratori Della Giustizia” (Colaboradores da Justiça) e os colaboradores de “Pentiti” (Arrependidos). Na Espanha, o colaborador é chamado de “Delincuente Arrependido” (Delinquente Arrependido). Nos Estados Unidos adota-se a expressão “Plea Bargaining” (Transação Judicial” e encarada como mais uma transação entre as muitas constante do Direito Positivo no mundo inteiro.

Como se vê, esse apelido pejorativo dado ao instituto processual, disseminado por todos os operadores de Direito, pomposos juristas e jurisconsultos, magistrados, jornalistas, parlamentares faz parte do vezo cultural no Brasil de desmoralizar as instituições sérias do país para manipulá-las em seu benefício. Ao perceber que o instituto processual da COLABORAÇÃO PREMIADA, ou seja, a COLABORATORI DELLA JUSTIZIA foi o instrumento responsável pelo desmoronamento da Máfia Italiana, a Camorra Tupiniquim tratou de acautelar-se e, para começo de uma ação planejada, cuidou logo de apodar a Colaboração como Delação e estabelecer uma relação capciosa com as figuras do Delator, Dedo Duro, Alcagueta para desacreditar os Colaboradores!

E a Nação inteira foi anestesiada e até hoje todo mundo, mas todo o mundo mesmo, permanece ignorando a designação legítima do remédio processual. A operação foi uma manobra tão diversionista, tão competente, que até os policiais, os procuradores, os juízes, os desembargadores e ministros estão adotando o apelido indigno e contribuindo, ingenuamente, para a perpetuação da farsa criminosa!

Pela apelidação ultrajante, difunde-se de modo subliminar e solerte, insinuado nas mentes mediante a utilização do método Goebells para condicionamento da opinião pública, mas, na verdade, em pre-monição somente reservada aos santos, para preparar a salvação dos empresários mais afortunados do país e os corruptos.

Além do ataque à ordem legal, lamentavelmente endossado por um raciocínio no mínimo contraditório e extravagante da Suprema Mandatária da Nação quando – no seu entender - criou por lei a figura do Delator que tanto odeia, busca-se desmoralizar também os magistrados e o Ministério Público que conduzem o processo.

Mas, terminei encontrando a fonte de inspiração de D. Dilma num trabalho do tratadista Carlos Fernando dos Santos Lima, já nos idos de 2005, que transcrevo abaixo:
      “Primeiro ponto a ser superado é o da suposta imoralidade desse acordo, comparado muitas vezes à traição. Amiude seus detratores equiparam os investigados/réus/colaboradores a Juidas Iscariotes ou a Joaquim Silverio dos Reis. Trata-se de imagem forte, mas destituída de qualquer razoabilidade. 
Nenhuma pessoa delatada é Jesus Cristo nem Tiradentes. Não há regra moral na omertá, não se pode admitir como obrigação ética o silêncio entre criminosos. Na verdade, a obrigação é para com a sociedade. O que existe realmente é o dever de colaborar para a elucidação do crime, pois esse é o interesse social”

 Impressionante ou não a coincidência?. Observa-se a infelicidade da declaração da Presidenta, proferida no Exterior (que vergonha!) ao reconhecer em sua comparação a existência de uma ética entre criminosos.

 Graduei-me em Direito em 1966 e continuo um aprendiz em minha modesta sabença e peço perdão aos meus caros colegas pelas barbaridades que estão sendo cometidas por alguns deles em nome dos seus galardões como dirigentes ou ex-dirigentes do nosso órgão máximo. Atingi uma altura da vida em que – como o Mestre Graciliano – não necessito usar reticências desde que não tenho conveniências a respeitar.

 Esta semana li nos jornais declaração do Presidente e da Vice-Presidenta da OAB-Pernambuco. Parabens aos dois pela justeza das observações, mas surgem outros que concordam com as observações judiciosas MAS ( e aí aparecem os malditos “mas” para fazer média) e ressalvam o cuidado de que devemos ter com possíveis excessos dos julgadores e do Ministério Público. Lógica digna do Conselheiro Acácio, magistral criação eciana, para realçar a obviedade das coisas.

 Assusta-me ler uma entrevista de “WADIH DAMOUS” um intitulado ex-Presidente da OAB/RJ que, ora em exercício do cargo de Deputado Federal pelo PT, como suplente convocado,  ataca, de forma deselegante, desrespeitosa e chula o Juiz Moro, condutor dos processos do chamado Lava Jato. Veja as diatribes que comete esquecendo, ele sim, o que é ética, respeito aos magistrados, à ordem legal, às instituições e mais preocupado em defender suas convicções partidárias e, possivelmente, para se credenciar à conquista de belos honorários:

 “O juiz que preside esse inquérito, o Dr. Sérgio Moro, tem traços de paranoia. Porque ele coloca a hipótese acima do fato. Juiz não pode trabalhar com hipóteses. A polícia e talvez Ministério Público, sim. Mas o juiz não. O juiz trabalha com elementos objetivos.”

Como justificar, Dr. Wadih, uma agressão gratuita como essa ao Juiz Moro por estar mandando para cadeia os ricos corruptores, se até agora, nenhum recurso contra as decisões do Juiz Moro foi acatado por qualquer tribunal superior, inclusive o Supremo Tribunal, através do Relator Min. Zavaski, nomeado por sua correligionária Presidenta, portanto, absolutamente isento. Os Ministros e Desembargadores que apreciaram e negaram os recursos para manter as decisões do Juiz Moro, também tem traços de “paranoia”?, Mais adiante ainda pontifica na desastrada entrevista, referindo-se ao Juiz Moro como chantagista e deve estar apreciando sob a ética parlamentar que não existe como todos sabem. Nunca pela Ética da classe dos Advogados:

“Usa a prisão para chantagear, para obter delações. Estabeleceu a delação premiada como algo essencial ao deslinde dos casos que estão sob apreciação dele. Reputo a delação premiada como algo imoral. O delator para mim chegou ao ponto mais baixo da espécie humana. Tenho ojeriza a delatores, a dedo-duro. Quem lutou contra a ditadura sabe o que é ser um dedo-duro, um delator (olha a orquestração ensaiada com um discurso repetitivo e enfadonho). O juiz Sérgio Moro acha isso essencial, mostrando a impotência e a incapacidade de fazer uma investigação mais aprofundada.”

Ops, Dr. Wadih – ato falho -. Desde quando o juiz faz investigações ? Nunca gostei de Direito Penal e sou quase analfabeto na matéria, mas aprendi que a investigação é procedida pela Polícia e o Ministério Público e cabe ao Juiz apurar a veracidade da investigação no âmbito do processo judicial. Esse Moço deveria aproveitar o tempo disponibilizado pelas mordomias do legislativo, para ler mais e se instruir a respeito do que questiona. Se assim procedesse, saberia também que o Juiz do feito NÃO TEM QUALQUER PARTICIPAÇÃO na formação da Colaboração Premiada, conforme preceitua o art. 9º da Lei nº 12.850/13, em seus § 6º e 7º

“Parágrafo 6º: O juiz não participará (GRIFOS NOSSOS) das negociações realizadas entre as partes para a formalização do acordo de Colaboração. Que ocorrerá entre o delegado de policia, o investigado e o defensor, com a manifestação do Ministério Público, ou, conforme o caso, entre o Ministério Público e o investigado ou acusado e seu defensor.

 Parágrafo 7º - Realizado o acordo na forma do § 6º, o respectivo termo, acompanhado das declarações do Colaborador e da cópia da investigação, será remetido ao juiz para homologação, o qual deverá verificar sua regularidade, legalidade e voluntariedade, podendo para este fim, sigilosamente, ouvir o Colaborador, na presença do seu defensor”.

Como se vê, parece que o mundo enlouqueceu. A acusação ao Juiz Moro é mentirosa, falsa e aleivosa. O objetivo é insidioso e abarrotado de má-fé. Quem tiver a paciência de ler integralmente a Lei citada, vai verificar que TODOS OS ATOS (todos mesmo!) DA COLABORAÇÃO PREMIADA são assistidos e certificados pelo Defensor do Colaborador, sem o que caberia ao Juiz, aí sim, anular o ato por irregularidade essencial. E a maior aberração é arguida por grandes mestres da ciência jurídica, digna dos melhores momentos de Chico Anísio quando denunciam o sigilo das investigações como cerceamento de defesa, pelo fato de que os defensores não têm acesso às investigações.

A advocacia brasileira deve ser a única no mundo que se presta a defender tese tão ridícula. Como piada, nem é nova pois conheço desde menino a estória dos agentes secretos portugueses que se obrigavam a ostentar no peito um crachá revelando sua condição funcional.

Entretanto, como se diz: não existe nada de tão ruim que não possa piorar, o moço foi mais longe quando acusa o Juiz Moro e os Procuradores de destruidores da economia brasileira e convoca os “juristas de todo o pais para bradar contra as arbitrariedades da Lava Jato”:

“E o pior: este juiz quer quebrar a economia brasileira? Ele e esses procuradores querem o quê? Desnacionalizar setores estratégicos da economia nacional? Colocar no olho da rua milhares de trabalhadores? É para isso que existe a Operação Lava Jato? Vamos reunir juristas de todo o país para bradar contra as arbitrariedades da Lava Jato. Pretendo organizar um manifesto em defesa da democracia que a operação está ameaçando

Defesa da democracia ? Chega Deputado, pois já não lhe respeito mais como advogado e proíbo-lhe de me representar na indignidade proposta! Já assisti esse filme. A declaração é tão estapafúrdia que nos dá o direito de imaginar que, a exemplo do PROER criado no governo de FHC para socorrer alguns bancos que estavam quebrados, sob o pretexto de risco sistêmico, deve estar em gestação um PROCORRUPT para salvar as empresas milionárias que foram flagradas, sob a desculpa amarela de “Defesa da Democracia”. Libere-se a imoralidade, perdão para os corruptos, locupletemo-nos todos e continua tudo como dantes no Quartel de Abrantes ? Que democracia, Dr.Wadih ? Vade retro !  

“Ao ser questionado se, na opinião dele, o esquema de corrupção em torno da Petrobras ainda não estaria comprovado, responde que não sei o que é fato ou não. Não sei, porque uma atitude arbitrária, como a que caracteriza a conduta dos juízes e procuradores, cria confusão até para quem é do mundo jurídico sobre o que é fato e o que não é.”

O que é que é isso ? Um Deputado Federal com a origem profissional que detém, não lê jornais ? Vive em outra galáxia ? Não tomou conhecimento da deliberação da Petrobrás reconhecendo e reajustando sua contabilidade para conformá-la ao prejuízo sofrido através da corrupção e reconhecido por Deliberação de seu Conselho de Administração, baseado em pareceres de Auditoria Independente ? Providência essa exigida das sociedades de capital aberto pelas Bolsas de Valores e órgãos reguladores de investimentos, inclusive nos Estados Unidos? Duvida da sanidade mental dos brasileiros, imaginando-os um aglomerado de imbecis ? Diante de todas provas e o procedimento da própria Petrobrás reconhecendo a sua existência pela correção procedida em sua contabilidade, é honesto questionar a corrupção reconhecida pela própria Petrobrás? Quer convencer quem ? Os incautos, os idiotas e os simplórios ?

Sou do tempo em que o vestibular de direito exigia prova de conhecimento de latim. Tive que estudar e aprendi muito pouco, mas tenho ainda decorada uma frase das Catilinarias de Cicero:

“QUOUSQUE TANDEM, CATILINA, ABUTERE PATIENTIA MOSTRA”. É muita coisa sem juízo!



sábado, 4 de julho de 2015

É MUITA COISA SEM JUÍZO - EPISÓDIO 1

De algum tempo, tenho me preocupado muito com o que se passa em nossa nação. É possível que se passe também em outras paragens, mas essa é a terra em que vivemos e amamos. Parece que o bom senso, a lógica elementar, os princípios, a solidariedade, a tolerância, o respeito, a sensibilidade e o amor à natureza e às gentes se perderam em alguma galáxia e desapareceram da nossa vida. Estamos vivendo um tempo em que, no sempre sábio dito popular, “até vaca tá desconhecendo seu bezerro”. E isso ocorre assustadoramente em todos os segmentos e escalões da sociedade. Sou um velho beirando os 90 anos muito bem vividos e já assisti muita coisa e muita mudança conceitual, por força mesma da evolução natural, das transformações sociais e movimentos políticos. Todo o pouco que sei, colhi na vida, sem mestrados nem doutorados e continuo vendo e observando os fatos e sua natureza. E as insanidades acontecem em ritmo alucinante, numa sucessão desmensurada de insanidade mental, como se todos estivessem desvairando. Seria um tema inspirador para Saramago escrever um “Ensaio sobre a Loucura”, considerando sua disseminação no país.

Para não ser muito prolixo, vou tentar descrever o desvario por cada setor de atividade neste Brasil e vou tentar exemplificar as coisas a partir da paixão nacional: futebol, em face do que acabei de assistir e acompanhar pela imprensa o resultado da participação do Brasil na Copa América.
1.      A nação Brasileira, detentora de um Penta Campeonato Mundial, sofre em sua casa uma retumbante derrota de 7 a 1 da Alemanha na Copa do Mundo de 2014 e a máquina (ou máfia) oficial do futebol continua imperturbável como se nada tivesse acontecido e somente diante do clamor popular, muda o técnico e prossegue tudo com dantes. Convoca-se uma nova comissão técnica, comandada por especialista em chupar a própria língua que passou quatro anos desempregado e continua sem nunca ter sido técnico de nenhum clube brasileiro ou estrangeiro já que nenhum clube teve coragem de contratá-lo, salvo uma curta passagem pelo Internacional, e um Coordenador cuja conhecida profissão é a de Empresário de Jogadores de Futebol. Não dá para entender.

Essa dupla, depois de convocar, treinar e botar em campo uma seleção medíocre com participação de jogadores que ninguém tinha ouvido falar e alguns jogam em times que ninguém sabe sequer pronunciar os nomes. Poucos reclamaram ou contestarem, sobretudo a crônica esportiva, que em estranho conluio optaram pela leniência e omissão, salvo honrosas exceções. Só depois do desastre, é que surgem monstros sagrados da crônica esportiva, levantando restrições sobre a organização tática e técnica da seleção e convocação imerecida de alguns jogadores. É um contra senso total.

Impressionante é que, conforme a imprensa acaba de noticiar, um dos símbolos do esporte nacional sem o menor deslize profissional ou pessoal, o respeitado Zico, fez referência com justas razões ao evidente conflito de interesses oriundo da dualidade de Coordenador de nossa seleção e Empresário de Jogadores.

Foi suficiente para o Coordenador Gilmar fazer pose de ofendido, levantar dúvidas quanto a honorabilidade de Zico e tentar inverter os fatos ao ameaçá-lo com um processo na Justiça. Esse estilo do moço segue a escola que está se arraigando no Brasil na base da histriônica formulação de Stanislaw Ponte Preta: “Se todos são corruptos, estamos justificados e locupletemo-nos todos”. Lembro com mais precisão daquele personagem criado pelo saudoso Chico Anísio com o bordão de “Sou, mais quem não é ?”. Alegar a generalização da corrupção é honesto ?

Fizeram uma participação bisonha na Copa América ao deixar empatar o jogo com o Paraguai, na forma de um pênalti cometido por um zagueiro de seleção, em lance hilário, que serviu de charges imediatas o figurando como um jogador de volei dando uma cortada em plena grande área. Depois disse que “não me lembro de haver tocado a mão na bola!” Para coroar, na decisão do empate, dois penaltis desperdiçados de forma ridícula e o treinador Dunga declarando em entrevista coletiva de forma ridícula e irresponsável que substituíra Robinho porque estava cansado e àquela altura do jogo não estava pensando em cobrança de pênaltis.

Confissão de irresponsabilidade total de um técnico, sabido que em jogos chamados de mata-mata a decisão por pênaltis é uma inevitabilidade e todos treinam exaustivamente sua cobrança desde antes do jogo. Que estória da carochinha é essa? que jogadores de seleção são esses que não tem forma física para suportar os normais 90 minutos de uma partida ? E se não tinham condição física bastante, porque foram escalados e entraram em campo ? Como admitir que um técnico de uma seleção desconheça coisa tão elementar. É surrealismo puro.

Como se não bastasse, o Sr. Dunga confessou a sua incompetência e absoluto despreparo para a missão, quando completou a declaração à imprensa dizendo que “a experiência foi ótima para a seleção” (pelo visto, não bastaram os 7 a 1, nem o vexame da Copa América).

Pirou de vez e necessita urgente de uma intervenção psiquiátrica ou então considera o povo brasileiro como um aglomerado de imbecis.

Aí fica fácil entender a histórica e fantástica corrupção que há muitos anos domina o futebol brasileiro, tão forte que é protegida por uma notória “Bancada da Bola” no Congresso Nacional, denunciada corajosamente em plenário pelo surpreendente Senador Romário. Lembrem que uma CPI do Futebol foi arquivada por atuação dessa bancada. E para a CBF cair nas páginas policiais, foi precisa a ação do FBI que mantém preso em terras da Suiça o tal de Marin, ex-Presidente da CBF, sede do futebol mundial; fez o atual Presidente Del Nero, voltar às carreiras para o Brasil em pleno transcurso da Assembléia da Fifa; e o outro ex-Presidente Ricardo Teixeira abandonar às pressas os Estados Unidos onde estava residindo. Verdadeira debandada geral, salve-se quem puder.            

A sucessão dos episódios deixa transparecer que, para nossa tristeza e vergonha, a fantástica corrupção da FIFA, teve sua genetriz e também foi institucionalizada por influência da experiência brasileira na CBF, sabido que o brasileiro João Havelange foi Presidente da FIFA durante o curto (!) período de 24 anos até deixar em seu lugar o Joseph Blatter e na Presidência da CBF o seu genro Ricardo Teixeira. Daí começou a bandalheira que tomou conta do mundo inteiro. É muita coisa sem juízo!

segunda-feira, 22 de junho de 2015

A BELEZA DA PASSEATA DE CANDEEIROS

 Por conta da minha idade, recebo muita pressão para contar as histórias do meu tempo e, sobretudo, as que testemunhei e das quais fui protagonista. Pouca gente sabe e pondo a modéstia de parte, resolvi extravasar minhas vaidades e manifestar o meu orgulho de ter sido o Coordenador do Programa de Eletrificação Rural no Governo de Miguel Arraes, que depois foi considerado o maior programa de eletrificação rural da América Latina. Essa história e a sua relevância não foi contada para conhecimento do povo de Pernambuco e, pelo jeito, só não é desconhecida, até hoje, pelos pequenos e pobres beneficiários que a tinham como inalcançável. 

Quem é jovem e hoje avista a rede de luzes que ornamenta a zona rural de nosso Estado não pode imaginar a tristeza da escuridão que dominava a paisagem trinta anos atrás. Iluminação elétrica no campo só era possível para os grandes proprietários que tinham condições de bancar, às suas expensas, o elevado custo de uma rede de eletrificação com os indispensáveis postes, transformadores, travessas, isoladores, quilômetros de fios e mão de obra qualificada. Para os pequenos proprietários, era um sonho inatingível!
Em 1986, encerrada a mais bela e emocionante campanha política que Pernambuco assistiu, consagrando um segundo mandato de Governador para Miguel Arraes, em que o mote era: “volta Arraes ao palácio das princesas. vai entrar pela porta que saiu” e o “tô voltando”, permanecemos na sede da campanha, ali naquele casarão da Av. Ruy Barbosa que pertenceu à família Comber, para organizar a transição e as primeiras providências do governador eleito.

Nessa ocasião, fui procurado pelo engenheiro da Celpe (então órgão estatal), conterrâneo e amigo José Luiz Sampaio (hoje, por causa, conhecido como Zé da Luz) que me relatou a existência de um projeto de eletrificação rural concebido por um grupo de jovens engenheiros de que ele fazia parte, liderado por Hélio Lopes, que veio a ser Diretor da Celpe e atualmente é Diretor da Arpe, Emerson Souto e Alberto Pereira e, como é natural, queriam fazer chegar às mãos do Governador Arraes para o seu conhecimento.
De acordo com minha solicitação Zé da Luz levou o Grupo à minha presença levando o projeto que eu não tinha condições de avaliar por falta de conhecimentos técnicos e como à essa altura, já estava escolhido como Secretário de Minas e Energia o Eng. Drummond Xavier, o entreguei em suas mãos para sua avaliação.

Logo no dia seguinte, fui procurado por Drummond que, entusiasmado pela qualidade do projeto, queria um contato urgente com o grupo, e me lembro que chegou a fazer um comentário, dizendo: “O projeto, Ivan, tem princípio, meio e fim”. Era inovador, adotava um sistema denominado de “monofilar”, pois usava apenas um fio para transmissão, que resultava em substancial redução de custos, na medida em que subdimensionava a estrutura necessária para sua implantação, sem perda de sua qualidade técnica.
O Governador Arraes encantou-se com o projeto e cuidou logo de estruturar a execução do projeto em seu governo, para o que, logo de início, nomeou o Engenheiro Hélio Lopes para a Superintendência de Eletrificação Rural da CELPE. Abro aqui um parêntese para lembrar que, entre o segundo e o terceiro governo Arraes, houve uma tentativa de desqualificar o processo adotado, sob o pretexto de que não era seguro e poderia ocasionar prejuízos, sustentado em discursos até por secretários de Estado. A tentativa foi frustrada e o Governador Joaquim Francisco prosseguiu com o programa.

Não pensem que foi fácil. À medida em que se iniciava a execução do programa, com elaboração dos pequenos projetos das comunidades, orçamentação, busca de recursos, verificação dos critérios estabelecidos pelo Governador atendendo à economicidade, concentração de unidades atendidas para redução do custo médio, possibilidade de utilização da energia para melhoria da condição de vida dos beneficiários, confortos que possibilitassem a fixação no campo, começou o alvoroço das comunidades por vislumbrarem a possibilidade de conseguir o benefício.
Foi um trabalho duro, mas gratificante. Trabalhávamos com quatro planilhas que iam desde a solicitação do benefício à conclusão da obra e o monitoramento constante. Todos os meses nos reuníamos na Diretoria da Celpe para avaliação dos resultados e necessárias correções que, por vezes, se impunham. Já era, na verdade, o monitoramento hoje adotado na gestão do Estado de Pernambuco, com muito êxito. Lembro, com muito respeito, todos os servidores da empresa que trabalharam e muito pelo programa e, sem desdouro dos demais, recordo com respeito os colegas do grupo de jovens engenheiros e os Presidentes Dilton da Conti e Fábio Alves.

E foi inevitável, quando os primeiros e ainda modestos projetos foram instalados nas comunidades a grande demanda ainda represada explodiu. O alvoroço foi grande e, no dizer do saudoso Lívio Valença, foi “como soltar uma onça no chiqueiro dos bodes”. Nas pequenas comunidades, os sítios mais afastados, os sonhos mais reprimidos foram despertados como realidade.  Começa a ser concreto um quimérico motor para aliviar o esforço na ralação da mandioca nas casas de farinha, uma pequena moto-bomba para ajudar na aguação das plantas e a luz elétrica clareando o negrume das noites.   
Aí os inconformados adversários começaram a perceber a grandeza do projeto e o efeito devastador da mobilização das comunidades carentes da zona rural, logo estendido aos programas de baixa renda nas zonas urbanas, favorecidos por um inimaginável benefício que nunca pensaram um dia conseguir. E a campanha foi terrível e solerte. Não faltaram os economistas de ocasião para acusarem os benefícios do Governo Arraes como desestruturadores e que nada acrescentavam para o desenvolvimento econômico do Estado e, por consequência, para a sua população.

Em resposta a esses ataques, Arraes fez uma ponderação precisa e fulminante que nunca esqueci: “não conheço nada mais estruturador para um cidadão que uma caneca de água limpa para beber e um bico de luz para alumiar a escuridão”, que explica o seu pensamento, e não tenham dúvidas, que  a eletrificação rural mudou a face do campo para bem melhor.
Foi uma marca de governo inconfundível e os humildes beneficiários nunca esqueceram. Ainda hoje, quase trinta anos depois, sou surpreendido por muitas pessoas dos grotões do sertão até à mata, cobrando-me a lembrança dos nossos contatos, desde a solicitação do benefício até a sua entrega com as festas que promoviam quando da inauguração dos projetos em suas comunidades. Pensem numa alegria contagiante que, pelo hábito, terminava num verdadeiro e espontâneo ritual em todos os dias de inaugurações da eletrificação. Era uma coisa linda e valia a pena assistir.

Invariavelmente, a comunidade promovia uma passeata chamada de “adeus candeeiro!”. Caminhada circulando por toda a comunidade, as pessoas carregando na cabeça os fio-fós apagados que eram até então o único meio utilizado para clarear o mundo, a banda de pífanos puxando o cortejo, a cachaça e o vinho de jurubeba correndo soltos, a galinha gorda guisada com farofa para tira-gosto e, ainda mais, a alegria de felicidade escancarada em todos os moradores do sítio, coroada pela dança no final da festa.
Alguns, já exibindo orgulhosamente na sala da sua casinha o rádio adquirido a prestações na loja da cidade, deixando de lado o “radinho” de pilha que sustentava, até então, a comunicação da comunidade com o resto do mundo. Outros, mais afortunados juntavam a família e conseguiam colocar uma geladeirazinha na bodega para garantir uma cerveja gelada. Alguns, radiantes, acendendo e apagando as lâmpadas de casa para comprovarem a sua efetiva existência. Outros mostrando, encantados, o motor elétrico já instalado no “caititu” da casa de farinha que, daí em diante, livrava as pessoas do penoso trabalho de acionar o volante manual do ralador de mandioca.

Só quem assistiu e conhece a dureza da vida no campo pode entender a felicidade de uma velha senhora, matriarca de sua família, sentada na salinha da casa de taipa e chão batido, admirando a luz acesa e que, advertida pelo filho que já era tarde e deveria recolher-se para descansar do dia muito agitado, respondeu com toda a veemência: “me deixem aqui, que era só que faltava eu ir dormir agora. vou passar a noite admirando essa belezura de uma lâmpada acesa que nunca pensei que um dia ia ver na minha casa 
Vejam quanta coisa bonita e quanta melhoria de vida a eletrificação rural trouxe para a população humilde do nosso Estado, a ponto de no final do governo Arraes em 1998, Pernambuco ter 83 % de suas comunidades rurais eletrificadas. Orgulho-me, e entendo com justas razões, de ter participado de um programa tão valioso para o nosso povo junto com um grupo de técnicos excepcionais, sob o comando de Miguel Arraes, maior líder político do nosso Estado, e que deixou uma marca definitiva de uma visão humanista capaz de entender a alma de nossa gente e, por isso mesmo, merecedor da gratidão de sua população mais carente e quase sempre injustiçada.

Centenas de Comunidades nunca haviam recebido qualquer benefício ou atenção dos governos e a única ação do Poder Público conhecida pelos moradores desses grotões era a atuação da polícia para reprimir uma cachaça mais exagerada nas bodegas em dias de feira. Aí eram certas a prisão do temível infrator e a intervenção do chefe político para soltá-lo e mantê-lo sob sua dependência pelo favor prestado. O Programa de Eletrificação Rural e o Chapéu de Palha foram as marcas determinantes e refletem muito bem o foco de um governante voltado para as camadas mais necessitadas do Estado. Esses programas representaram uma libertação para o homem do campo e lhes garantiram o conhecimento de uma coisa chamada CIDADANIA. Nada como uma caneca de água limpa e um bico de luz!

sábado, 20 de junho de 2015

AS INFAMES PRIORIDADES NO SERVIÇO PÚBLICO

Faz pouco tempo, fiquei impressionado com uma excelente reportagem de Magno Martins sobre as sete cidades dos sete Estados do Nordeste que deram as maiores votações a Presidente Dilma. O jornalista levantou e realça uma acentuada relação entre a votação, a população, a incidência de beneficiários do Bolsa-Família e o analfabetismo. Nada contra o programa que tirou milhões de brasileiros da miséria absoluta há mais de dez anos, mas estarrece a constatação de que mais de 60% dos seus beneficiários permanece ainda sem qualquer qualificação profissional por faltar-lhes o elementar requisito da alfabetização.

Esse contingente incorpora-se aos vinte milhões de analfabetos totais, sem contar os funcionais, ainda vergonhosamente existentes no Brasil. Evidente que permanecerão por toda vida na infamante dependência da ausência de profissão qualificada, por faltar-lhes a mais  elementar capacidade do ler e do escrever. Fala-se muito em educação, sucedem-se os seminários, debates e conferências sobre o assunto sem discutirem uma coisa básica que no dizer de Cristovam Buarque chama-se PRIORIDADE. Desvia-se o foco da questão e condena-se a existência da Bolsa Família, sem analisar e reparar as condições que condicionam a sua existência. Durante todo esse tempo nada foi feito para, pelo menos, alfabetizar os brasileiros que só aprenderam na vida a plantar milho e feijão enquanto esperam que Deus dê chuva para garantir a safra e isso se conseguirem um palmo de terra pra plantar. 
O Conselheiro Acácio diria que TUDO COMEÇA DO COMEÇO, mas como resolver o problema da educação dessa nação-continente sem cuidar do mais elementar e primário que é a ALFABETIZAÇÃO ? Os meios de divulgação estão cheios de siglas PROUNI, FIEPES, PRONATEC, Escolas de Referência, Programas de Intercâmbio, Novas Faculdades e Universidades, Cursos de Mestrados e Doutorados, Bolsas no Exterior, pelo que a Nação está inexoravelmente condenada a ser formada exclusivamente por DOUTORES e por ANALFABETOS ?

Para que não se imagine qualquer ranço eleitoral, confesso o meu estarrecimento quando, ao dirigir a área de mediação de conflitos no governo estadual, fui surpreendido pela máxima reivindicação de marisqueiras pertencentes à uma Colônia de Pescadores em plena Região Metropolitana do Recife, nos seguintes termos: “Doutor, se a gente soubesse ler e escrever aprendia a consertar pranchas e barcos de resina e ia ganhar dinheiro de inverno a verão”.
E mais, em qualquer análise de prioridades na questão da educação, o mais sensato, lógico e elementar não seria a erradicação do analfabetismo, seguida da democratização da educação infantil mediante a universalização das creches no país que também amenizariam a tragédia das trabalhadoras pobres que não têm onde confiar a guarda dos seus filhos e poderem trabalhar tranquilas ?

Do mesmo jeito, a discussão travada em torno do caso José Estelita levou-me à uma reflexão sobre o desvio de focos das grandes questões nacionais. Talvez o subjetivismo de alguma beleza possa ainda seduzir para uma aprovação desse projeto. Afinal, tem gosto para tudo, mas não me encanta a verticalidade dos espigões. Não é novidade para ninguém que as mais belas e atrativas para o encanto do mundo são exatamente as cidades que não permitiram essa prática perniciosa, tendo como melhor exemplo Paris.
Na verdade, percebo que o grau de radicalização das posições a respeito do assunto leva a um exagero extremado, pouco explicável pelo bom senso, sobretudo por desviarem o verdadeiro foco da questão. Lí de um arquiteto, nosso amigo Alexandre Wanderley garoto que vi nascer em Garanhuns, que Recife já fez a sua opção de HELLRECIFE com a lamentável decisão do adensamento exagerado e sem planejamento adequado. Verifico, também, que nessa acirrada discussão, existe um claro desvio da verdadeira questão que está destruindo esta  cidade, além de que está em jogo na verdade uma clara competição de empresários imobiliários.

Porque as instituições dos arquitetos, urbanistas, engenheiros, sociólogos, antropólogos, ambientalistas, etc. não priorizam seus esforços e vão para as ruas e para os fóruns governamentais, reclamar das barbaridades cometidas no planejamento da cidade e reivindicar das chamadas autoridades responsáveis uma RADICAL MODIFICAÇÃO das normas que regem a ocupação do solo, o seu Plano Diretor, o Plano Viário e de Mobilidade protegendo TODA CIDADE, e não apenas o Cais José Estelita ?
Porque não se responsabilizam os responsáveis (ou irresponsáveis?) pelos projetos, concepção e execução das infames intervenções do Poder Público que resultaram nos verdadeiros atentados que se praticam no Recife, ao arrepio de todas as regras do bom senso ? Porque o desvio de foco em embates pontuais e localizados, quando a cidade está sendo destruída, como um todo, por essa orgia predatória devida à falta de uma regulamentação normativa técnica, decente e humanizadora ?

A degradação da cidade e do seu entorno é desoladora e a lista das desastrosas obras de engenharia e de urbanismo implantadas é estarrecedora e tão numerosa que não caberia neste texto! O estrago já é muito grande, mas ainda é tempo de salvar muita coisa, Basta uma mobilização bem orientada neste sentido, um comprometimento das entidades ligadas à atividade que daria o embasamento técnico e, lógico, uma decisão política! Seria, pelo menos, um auto de penitência dos engenheiros, projetistas e urbanistas pelas aberrações praticadas impunemente nas suas intervenções na cidade.
Só como exemplo mais evidente, porque não se buscam os autores e responsaveis pela criação e implantação de um investimento como a “Via Mangue” que já consumiu cerca de MEIO BILHÃO DE REAIS, e o seu custo não espanta, claro, pois na realidade  resume-se à um imenso viaduto com 4,5 km, todo assentado em pilotis dentro do mangue, com um dano ambiental fantástico, somente comparável com as extravagâncias dos emirados que constroem fantásticos arranha-céus no meio do deserto, como se isso fosse indício de progresso e não um  deslumbramento de imbecis ?

Mas o pior foi a “descoberta (?)”, na hora de inaugurar a excelsa obra com todas as pompas e circunstâncias e a presença da Presidenta, de que a via expressa tinha ida, mas não tinha volta e, conforme anúncio do Sr. Prefeito, ainda exige um investimento de mais cem milhões de reais para sua conclusão. E tem mais, a via é absolutamente interditada ao uso de transportes coletivos, pedestres e não dispõe, sequer, de ciclovias. Na contra mão das medidas reconhecidas e adotadas por todas as autoridades no mundo, privilegiam-se nesta cidade os transportes unitários em prejuízo dos transportes coletivos.
Insisto, por fim, que desvia-se o foco das questões para os acessórios e para os seus efeitos, sem qualquer discussão ou simples referências as causas que estão permitindo a existência de um longo e permanente processo de destruição de uma cidade tão linda quanto o Recife. Estão aí se sucedendo centenas de “Estelitas” sem uma simples palavra de protesto contra uma legislação permissiva e complacente, verdadeira responsável por todas as “ESTELITAS DA VIDA”!