sábado, 21 de fevereiro de 2015

BÊBADOS E DOIDOS MARAVILHOSOS DE GARANHUNS

Comecei a lembrar algumas personagens que marcaram o cotidiano da vida, em Garanhuns, com suas presenças constantes e o seu relacionamento com a população. Uns alcoólatras, outros malucos de à muito tempo, e ainda outros que associavam as duas  espécies, cada qual com suas peculiaridades, bordões, manias, comportamentos e disparates.

No entanto, com sua postura por vezes inconsciente, criavam características próprias que se incorporavam aos ditos populares e adotados pela população. Claro que seu número é grande e é provável que ocorram algumas omissões imperdoáveis. Paciência, amigos – como diz o cancioneiro popular: - “É muita coisa sem juízo” !

Vou começar e a coisa pode ir longe, pois o estoque é grande:

 O REI SIMÃO RAMOS DANTAS

Esse remonta ao meu tempo de menino (e como faz tempo!). Perambulava pelas ruas, corpulento e opado pela bebida, deslocando-se com dificuldade e usando alguns enfeites para simbolizar a sua condição régia. Doido manso, não incomodava ninguém e percorria alguns trechos das ruas da cidade para, em canto repetitivo e vibrante que era sua única distração, afirmar a sua condição honrosa que devia ser respeitada por todos.
Lembro um dia em que postado na esquina da Rua 13 de Maio com a Rua Dantas Barreto, calçada da casa de Seu Chico Branco em frente de onde eu morava, cantava o seu recalcitrante refrão emitido por sua voz ainda muito forte:

“EU SOU O REI SIMÃO RAMOS DANTAS.
REI DA COROA IMPERIAL
REI DE PORTUGAL E DO MUNDO INTEIRO EM GERAL”

Era muito rei, não ?

CATREVAGE

Esse não faz tanto tempo e é provável que muitos ainda se lembrem dele. De origem muito modesta, era só doido mesmo e sua obsessão era a elegância e, para tanto, arrumava uns velhos paletós amarfanhados, flor na lapela e lenço colorido no bolso.
Figura magra, esquálida e imaginava-se, graças as suas vestes e adereços extravagantes, um padrão de sucesso. Tinha uma característica voz arrastada e gostava de comparar-se com as pessoas elegantes da época.

Muitos lembram, ainda, das noites de domingo na calçada em frente do Cinema Glória, em que se formava o indispensável “quem-me-quer”. Os rapazes postados na orla da calçada, formando um corredor para o desfile das moças e todos vestidos com as suas melhores roupas. Daí nasceram muitos noivados e casamentos, Namoros, nem se fala! 
Representava melhor distração do que as próprias sessões do cinema.
Um belo dia, um moço que, se não me engano, trabalhava no Banco do Povo – não consigo lembrar o nome - e que gostava de andar sempre bem vestido e adotando os ditames da moda masculina da época, foi participar do “quem me quer” das belas noites de domingo.

Lá pras tantas, não demorou para Catrevage defrontar-se com o moço tão janota e realmente encantado com a sua elegância, parou em sua frente e, com o seu característico linguajar, deu a  sua opinião sem que fosse solicitada:
“TÁ NA MALHOR DAS BOSSA. SÓ SENDO IRMÃO DO  CATREVAGE”

O moço não tinha espírito esportivo e foi preciso a intervenção da turma do deixa disso para evitar um desentendimento feio!

 
NEPOSIANO

Já foi comentada pelo  Grupo Fatos e Fotos de Garanhuns, a existência de Loia – pessoa boníssima – que vivia com seu irmão Zeca (José Rodrigues de Souza) – na praça D. Moura, esquina da Rua Afonso Pena), que se imaginava assediada pelo rapazes da época. Primos do meu pai e sempre mantivemos uma relação familiar muito  forte. Afinal éramos todos ribeirinhos do Rio Canhoto e, até hoje, qualquer casa daquela região abriga um parente nosso e isso representa, para nós, imensa satisfação.
É provável que não lembrem de um terceiro irmão, Neposiano, alcoólatra que vivia perambulando pelas ruas, sem trabalho e sempre a espera de um conhecido que lhe desse a oportunidade para traçar uma boa lapada.

Os pés inchados, andava com enorme dificuldade sobretudo quando a dose passava da conta. Vivia modestamente com sua mãe (tia do meu pai Zébatatinha) em uma pequena casa - com um também pequeno quintal que obedecia às práticas da época, incluindo a criação habitual de um porquinho para ajudar na manutenção da família – alí na Rua Mons. Afonso Pequeno no caminho do bairro da Brasília de hoje.
Imaginem como era difícil sua locomoção na subida da ladeira!

A sua rotina foi quebrada com o falecimento de sua mãe que ele adorava e era objeto de todo o seu ainda latente amor e a razão do  seu apego à vida.
No velório, ele estava transtornado e nada o consolava e não existia argumento que pudesse diminuir a dor que sentia. Chorando muito , foi até à porta da cozinha que dava para o quintal e quando avistou o porquinho que sua mãe criava, explodiu o seu queixume:

“AI, MEU DEUS, A PORQUINHA DE MÃE. QUANDO VEJO A PORQUINHA SÓ ME LEMBRO DELA!”
Ninguém se iluda. Um dos poucos valores que resistem à todas circunstâncias e sobrevivem no universo é, definitivamente, o AMOR.

 

 

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