No
entanto, com sua postura por vezes inconsciente, criavam características
próprias que se incorporavam aos ditos populares e adotados pela população.
Claro que seu número é grande e é provável que ocorram algumas omissões
imperdoáveis. Paciência, amigos – como
diz o cancioneiro popular: - “É muita coisa sem juízo” !
Vou
começar e a coisa pode ir longe, pois o estoque é grande:
O REI SIMÃO RAMOS DANTAS
Esse remonta ao meu tempo de menino (e como
faz tempo!). Perambulava pelas ruas, corpulento e opado pela bebida,
deslocando-se com dificuldade e usando alguns enfeites para simbolizar a sua
condição régia. Doido manso, não incomodava ninguém e percorria alguns trechos
das ruas da cidade para, em canto repetitivo e vibrante que era sua única distração, afirmar a sua
condição honrosa que devia ser respeitada por todos.
Lembro um dia em que postado na esquina da
Rua 13 de Maio com a Rua Dantas Barreto, calçada da casa de Seu Chico Branco em
frente de onde eu morava, cantava o seu recalcitrante refrão emitido por sua
voz ainda muito forte:
“EU SOU O REI SIMÃO RAMOS DANTAS.
REI DA COROA IMPERIALREI DE PORTUGAL E DO MUNDO INTEIRO EM GERAL”
Era muito rei, não ?
CATREVAGE
Esse não faz tanto tempo e é provável que
muitos ainda se lembrem dele. De origem muito modesta, era só doido mesmo e sua
obsessão era a elegância e, para tanto, arrumava uns velhos paletós
amarfanhados, flor na lapela e lenço colorido no bolso.
Figura magra, esquálida e imaginava-se,
graças as suas vestes e adereços extravagantes, um padrão de sucesso. Tinha uma
característica voz arrastada e gostava de comparar-se com as pessoas elegantes
da época.
Muitos lembram, ainda, das noites de domingo
na calçada em frente do Cinema Glória, em que se formava o indispensável
“quem-me-quer”. Os rapazes postados na orla da calçada, formando um corredor
para o desfile das moças e todos vestidos com as suas melhores roupas. Daí nasceram muitos noivados e casamentos, Namoros, nem se fala!
Representava melhor distração do que as próprias sessões do cinema.
Um belo dia, um moço que, se não me engano,
trabalhava no Banco do Povo – não consigo lembrar o nome - e que gostava de
andar sempre bem vestido e adotando os ditames da moda masculina da época, foi
participar do “quem me quer” das belas noites de domingo.
Lá pras tantas, não demorou para Catrevage
defrontar-se com o moço tão janota e realmente encantado com a sua elegância,
parou em sua frente e, com o seu característico linguajar, deu a sua opinião sem que fosse solicitada:
“TÁ NA MALHOR DAS BOSSA. SÓ SENDO IRMÃO
DO CATREVAGE”
O moço não tinha espírito esportivo e foi
preciso a intervenção da turma do deixa disso para evitar um desentendimento
feio!
NEPOSIANO
Já foi comentada pelo Grupo Fatos e Fotos de Garanhuns, a
existência de Loia – pessoa boníssima – que vivia com seu irmão Zeca (José
Rodrigues de Souza) – na praça D. Moura, esquina da Rua Afonso Pena), que se
imaginava assediada pelo rapazes da época. Primos do meu pai e sempre
mantivemos uma relação familiar muito forte.
Afinal éramos todos ribeirinhos do Rio Canhoto e, até hoje, qualquer casa
daquela região abriga um parente nosso e isso representa, para nós, imensa satisfação.
É provável que não lembrem de um terceiro
irmão, Neposiano, alcoólatra que vivia perambulando pelas ruas, sem trabalho e
sempre a espera de um conhecido que lhe desse a oportunidade para traçar uma boa
lapada.
Os pés inchados, andava com enorme dificuldade
sobretudo quando a dose passava da conta. Vivia modestamente com sua mãe (tia
do meu pai Zébatatinha) em uma pequena casa - com um também pequeno quintal que
obedecia às práticas da época, incluindo a criação habitual de um porquinho para
ajudar na manutenção da família – alí na Rua Mons. Afonso Pequeno no caminho do
bairro da Brasília de hoje.
Imaginem como era difícil sua locomoção na
subida da ladeira!
A sua rotina foi quebrada com o falecimento
de sua mãe que ele adorava e era objeto de todo o seu ainda latente amor e a
razão do seu apego à vida.
No velório, ele estava transtornado e nada o
consolava e não existia argumento que pudesse diminuir a dor que sentia.
Chorando muito , foi até à porta da cozinha que dava para o quintal e quando
avistou o porquinho que sua mãe criava, explodiu o seu queixume:
“AI, MEU
DEUS, A PORQUINHA DE MÃE. QUANDO VEJO A PORQUINHA SÓ ME LEMBRO DELA!”
Ninguém se iluda. Um dos poucos valores que
resistem à todas circunstâncias e sobrevivem no universo é, definitivamente, o
AMOR.
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