Como
referido em texto anterior, a falta de formação escolar de Zébatatinha foi o
maior incentivo para sua busca de conhecimentos através de uma leitura
constante que tornou-se a paixão de sua vida. Lia sem parar, era a sua
distração, possuía uma enorme biblioteca e todos os seus momentos disponíveis
eram dedicados à leitura. Formou uma bagagem cultural expressiva, eclética e
poucos assuntos escapavam de sua observação, análise e crítica cuidadosa.
Como lia bem
e muito, transformou-se em qualificado escriba no respeito às regras do
vernáculo, caligrafia bonita, imaginação e estilo insuperáveis. O pior que lhe
podia acontecer era a cegueira, aos 67 anos de idade, resultante de duas mal
sucedidas cirurgias de catarata. Viveu, portanto, os últimos 27 anos de sua
vida inteiramente cego.
Nunca se
lamentou, nem reclamou de sua desdita e conseguiu de forma surpreendente
adaptar-se à nova situação, criando procedimentos adequados. Tinha o seu
armário em que ele próprio arrumava os seus pertences mais usados e ia
busca-los na medida de sua necessidade, sem solicitar ajuda de ninguém.
Nas reuniões
da família que manteve durante todo esse tempo era sempre dos mais animados, cantando e
tomando a sua dose preferida de uísque puro, sem gelo, e que nunca ultrapassava
de um dedinho de altura. Nas entradas de Ano Novo, fazia um discurso emocional
(com rara competência e botava todo o mundo pra chorar) sobre a necessidade de
manter-se a unidade da família, mesmo após o seu desaparecimento.
Conseguia
manter sua indignação contra os deslizes da sociedade, preservando um bom humor
incrível. Um belo dia, à noite, sem saber que Arcoverde estava totalmente às
escuras, telefonei pra sua casa e foi ele próprio que atendeu – claro que no
escuro foi quem teve mais facilidade para se deslocar até o telefone - A minha
primeira fala foi perguntar:
que ele
respondeu de pronto:
“Pra mim está, meu filho. O pessoal aqui é que está reclamando da
escuridão. Só quem está no claro sou eu !”
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