domingo, 12 de julho de 2015

AH! OS LADRÕES DE GALINHA

Diante desse bombardeio constante de notícias sobre mal feitos, roubos, corrupção, alcançando cifras monumentais e dando a ideia de que isso é prática cotidiana, apertou-me uma saudade danada – até com certa nostalgia – dos LADRÕES DE GALINHA de antanho.

O roubo de galinhas na minha Garanhuns, como de resto em todas cidades de antigamente, era o delito mais ocorrente, dando constante trabalho aos policiais e nada mais degradante que a condução em desfile pelas ruas, custodiado por um soldado, até à Cadeia Pública, dos reles ladrões de galinha. A prática era contumaz por força da proliferação dos galinheiros existentes, praticamente, em todas as casas. Toda casa tinha um quintal e todo quintal tinha um imprescindível galinheiro.
Era a condição para manter-se um bom estoque de alimento sadio (naquele tempo não se falava em proteínas e coisas tais e não existia refrigerador para conservar comida) para o consumo da família e sempre à disposição da dona da casa para acudir a emergência de um convidado imprevisto. “Corre, Vicentina, para matar uma galinha pro almoço de Compadre Tonho que acaba de chegar!
Parece que estou vendo o ritual de todos os dias. Começava com o recolhimento dos ovos diretamente nos “ninhos” das galinhas poedeiras e, logo após, as pessoas encarregadas chamavam todo o galinheiro para receber a ração diária de comida, em forma de milho, xerém, alguns restos de comida, e ainda escuto o canto da chamada para atrair as galinhas, em refrão invariável: “titi,titi, titi....”.

Algumas delas eram postas para chocar e, por consequência, garantirem a renovação do plantel. Estavam sempre lá, impassíveis, sem levantar de seus ninhos para cumprir a tarefa designada e naqueles ovos ninguém tocava.
Galinhas gordas, de carne macia e saborosa, sem aditivos hormonais, asseguravam uma alimentação saudável para todos, sem contar a riqueza do paladar de uma galinha guisada com angú, uma galinha de cabidela usando o sangue fresquinho colhido na hora e batido com vinagre para não estragar, o requinte de um sarapatel de miúdos de galinha e a disputa da família, na mesa, pelas partes preferidas de cada um.

O galo reinando majestoso em seu harém e sempre ativo cumprindo o prazeroso ofício de satisfazer as suas odaliscas, complementado com a tarefa, sem erro, pela marcação das horas como se fora um relógio e invariavelmente cantando o alvorecer. Lembro de uma antiga marchinha de carnaval exaltando a eficiência do galo que dizia assim:
O galo quando canta Maria,
É dia Maria, é dia Maria.
Mas quando canta fora de hora
È moça roubada que vai dando o fora!

Como se vê, os galinheiros eram uma atração sedutora - desde que não tivesse cachorros na casa - dada a sua vulnerável localização sempre nos fundos dos quintais, a quantidade enorme de galinheiros que permitiam, até, uma escolha dos melhores plantéis disponíveis e os acessos mais fáceis, venda segura e, na alternativa, bela refeição para a família do larápio.
Aí começava, também, a parte mais difícil: a espreita até altas horas da madrugada no aguardo do momento em que todos estivessem dormindo, cochilando por vezes, mas atento aos menores sinais de movimento na casa. Chegando a hora favorável, pulava o muro e com a máxima rapidez possível, metia uma meia dúzia de galinhas em um saco.

Quando o dia amanhecia, o ladrão também amanhecia na feira para vender as galinhas por qualquer preço e por atacado, para se livrar depressa do objeto do roubo. Danava-se da vida, algumas vezes, pelo surgimento inesperado de outros concorrentes que, pelo excesso da oferta, fazia rebaixar o preço e sua cotação na feira.
O grande azar do ladrão é que frequentemente os donos das galinhas, ao acordar cedo, dava com o roubo no seu galinheiro e corriam pressurosamente à feira, na tentativa de encontrar  suas estimadas “penosas”. E não dava outra: Bingo! Lá estavam elas e muitas vezes ainda acompanhadas pelo autor do terrível delito. Não havia clemência, porradas no ladrão e convocação de um policial para prender e conduzí-lo até à cadeia para sua apresentação ao Delegado.  

Era terrível a humilhação sofrida pelo insignificante ladrão, ao percorrer a pés o longo trajeto desde a Avenida Santo Antônio (local da feira), Rua 13 de Maio, Praça Dom Moura, Rua Afonso Pena, até à Cadeia, no local que hoje abriga o Colégio Estadual, escoltado por um soldado, com a população à beira das calçadas durante todo percurso vaiando o infortunado meliante. Desconfio que a reprovação era muito mais pela mediocridade do roubo do que pela gravidade da infração!. Ladrãozinho vagabundo...
Com a reiteração das ocorrências e a exposição do seu nefando crime perante à população, claro       que tiveram sua atividade refreada e a possibilidade de sucesso reduzida. A liberdade de movimentos contida pela simples identificação já não permitia a sua continuação. O jeito era mudar de cenário e procurar galinheiros de outras cidades. O êxodo era inevitável mas eram logo substituídos por outros!

Falei, no começo deste texto, que lembro até com certa nostalgia dos ladrões de galinha, oriundos da singeleza dos costumes e da cultura dominante naquele tempo dos loucos maravilhosos como Manoel das Estrelas, dos desordeiros como Turrica, dos bêbados como Bode Cheiroso, dos filósofos como Jeitoso, e insiro aqui os anônimos Ladrões de Galinhas quando comparados com os faraônicos ladrões de hoje, como é o melhor exemplo um simples gerente da Petrobrás – executivo de terceiro escalão – que já devolveu a Nação nada menos que 97 (noventa e sete) milhões de dólares de um modesto (!) depósito na Suiça.
Palmas para os desprezíveis ladrões de galinhas.

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